10 de ago. de 2013

Coisa de Meninas



Ela era a minha melhor amiga, aquela que eu mais gostava de conversar, boa pra rir e pra chorar, talvez a mais espirituosa e por isso inteligente . Uma amiga daquelas como dizia Renato Russo: “Com quem você queira falar, por horas e horas e horas”... Mas ela não acreditava nisso ou talvez não fosse isso que ela quisesse ser. 

A inteligência emocional é traiçoeira, pois sentimentos quando aprendidos passam a ser pensamentos. Eu, com minha alma de criança pobre, era mais feliz que o Pequeno Príncipe com sua rosa pentelha e sua raposa chatinha .

 A felicidade é assim: satisfaz exatamente pelo que não nos dá, alimentando-nos com os sonhos do que aspiramos ter. 

Ter um amigo de verdade é muito mais do que ter um amor. Amor todo mundo, mais cedo ou mais tarde acaba tendo e quando não tem, pode inventar. Amor é palavra mágica, pó de pirlimpimpim, basta acreditar e voilá, ele é! Amizade  é diferente...  Deus foi amigo de Moisés, abriu-lhe o mar vermelho, saciou sua sede com água que brotou da pedra. Deus amava Cristo e...

Quando brigávamos, eu deixava pra lá. Sabia que era um defeito momentâneo, a amizade espera na mesma esquina em que o amor anseia e se desespera. Ela dizia coisas de mim para mim que não eram verdades, não porque ela mentisse, mas porque era assim que ela acreditava que eu fosse ou, porque talvez desejasse mudar tudo aquilo que achava que eu era... Sim, quem nunca desejou mudar o outro por inteiro para melhor aproveitar o que ele tem de bom?

Até hoje não anotei a placa do veículo que passou por cima de tantas histórias bonitas, mas tenho certeza que era mulher quem o dirigia, era ela e ela não sabia dirigir sua própria emoção. Um dia perdi a paciência e não quis repetir o script que a gente nunca ensaiou, mas éramos o improviso perfeito exatamente por isso. 

Cansei de não ter o selo de qualidade de uma amizade verdadeira, porque era jovem, porque cheguei tarde em sua vida, porque ela olhava pra mim e o tempo não passava como se eu fosse um Dorian Gray e ela o demônio preso no mal de nós duas.  A consciência do que se é pode  tornar-se  um balcão, uma “feira de rolo”, um mercado de pulgas, um pacto com o demônio...

Eu tive uma melhor amiga, que por ser única era diferente. Eu não sei se ela publicou meus segredos em línguas que desconheço para pessoas com as quais jamais me encontrarei. Eu não sei se sua memória é equipada com flash que ilumine a escuridão e torne o passado uma fotografia linda de se ver. 

Eu sei que eu vinha de sóis, ela chegava das cavernas e talvez nunca tenhamos nos encontrado de verdade, como da vez em que nos despedimos. Tenho por hábito hesitar demais, porque não volto atrás, por isso tive certeza  que todos os outros amigos eram mais importantes, eram mais antigos e para ela antiguidade era posto, enquanto pra mim aventura  é essência.

Eu tinha uma amiga, ensandecidamente sã, tão responsável e séria que não se deu o direito de ser feliz. Tinha mania de Pequeno Príncipe, aquele guri “encucado” que teve de partir para encontrar a rosa que já trazia no peito, mas... As pessoas crescem e não mudam, elas se mudam, se transferem, aprendem a enfrentar ou se esconder. Algumas partem, outras são mestras na arte da despedida.

Eu tive uma amiga que recusava meus convites, que queria que eu a adivinhasse, que não entendia que tanto faz, ser barco solto  no mar ou âncora fincada no cais, o resultado é o mesmo, todos sucumbimos diante do mar, poucos são felizes diante do amar.  Ela queria ouvir um texto que se esqueceu de me passar. A vida tem dessas coisas, é a perfeição que aponta os erros do que não está errado, apenas imperfeito.   
maio 2013|Revista-S! |

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