Como
surgiu o Dia da Visibilidade Lésbica , comemorado aos 29 de agosto? Porque o gay tem um dia do Orgulho e a lésbica um dia de
Visibilidade? Uma resposta óbvia e lógica seria que a lésbica não
é vista. Embora a homossexualidade, num passado recente, já tenha
sido considerada como doença pela OMS (CID 10), são praticamente
inexistentes relatos de pesquisas sobre a incidência dessa “doença”
em mulheres. No Brasil, no início do século XX, vários
homossexuais foram objeto de pesquisas, muitas financiadas pelo
Estado que buscava descobrir a cura para o “desvio da sexualidade”,
predominando os relatos sobre a homossexualidade masculina. Não é
de causar espanto, afinal, vivemos num ambiente onde a mulher sempre
foi vista como propriedade, como um objeto destituído da necessidade
de sentir prazer, incapaz de fazer opções das mais simples,
impedida de ter objetivos pessoais etc.
Apesar
desse histórico ainda hoje, circula o pensamento que mulheres gostam
de dinheiro e buscam no casamento um meio de sustento. A piada que
lésbicas se casam no 2º encontro, pode até ser engraçadinha mas praticamente serve como uma
justificativa para a quase inexistência, nos dias de hoje, de locais
exclusivos ou com atendimento especializado. A ausência de pesquisas
focadas no público lésbico, a falta de estatísticas, levam os empresários a não perceberem um nicho de mercado promissor. Tem
algo mais invisível do que isso?
Felipa
de Souza, foi uma portuguesa viúva que desembarcou em Salvador em
data desconhecida, casou-se com um pedreiro e ela sabia ler. Um livro
deixado na casa de uma amante, foi o estopim para a sua desgraça.
Interrogada pela Inquisição, sobre a presença de tal livro em sua
casa, sua amante, a analfabeta Paula de Siqueira, “deu o serviço”, relatando
seu envolvimento sexual com Filipa que por sua vez confessou o seu lesbianismo e
sua prática com mais 6 mulheres! (deu inveja? rsrs). Humilhada, chicoteada em praça
pública, Filipa foi exilada, expulsa, enxotada e a partir daí,
sobre ela não há mais qualquer registro. Foi arremessada para a
vala comum da invisibilidade ainda lotada até os dias de hoje. Isso
foi no ano de 1592 e Filipa tinha 35 anos.
Quanto
ao Dia Nacional da Visibilidade Lésbica, ele passou a existir em
1995, quando no SENALE – Seminário Nacional de Lésbicas,
reuniram-se mais de 100 (!) lésbicas com objetivo de pensar e
debater sua situação. Embora a data comemorativa seja exclusiva
da categoria lésbica, caberia a reflexão que ser lésbica é mais
uma das situações de preconceito que a mulher está exposta, se
levarmos em conta que na nossa sociedade há discriminação por
conta da cor da pele, religião, posição financeira, idade, tipo
físico e até naturalidade geográfica. “Aquela preta”, “aquela
gorda”, “aquela velha”, “aquela branquela”, “aquela
paraíba”, “aquela bíblia”, “aquela fanchona”, “aquela
macumbeira”, “aquela(e) sapatão”, “aquela magrela”, são
pejorativos discriminatórios que podem se combinar numa única
mulher e ainda se somar às outras eventuais deficiências que elas
possam possuir.
Alguém pode raciocinar que homens também passem por esse corredor polonês absurdo de ignorância, mas quem negaria a existência na prática do pensamento que um idoso quando se une a uma ninfeta é “macho mantenedor” enquanto uma senhora – mesmo uma celebridade - que relacione um garotão não passa de uma “sem-vergonha”? O que se pode comentar sobre a prática dos estupros corretivos regidos pela idéia de que uma mulher se torna lésbica pela falta de um bom órgão fálico? E sobre os filmes pornográficos ou imagens de arte erótica onde o prazer está sob ótica masculina?
Alguém pode raciocinar que homens também passem por esse corredor polonês absurdo de ignorância, mas quem negaria a existência na prática do pensamento que um idoso quando se une a uma ninfeta é “macho mantenedor” enquanto uma senhora – mesmo uma celebridade - que relacione um garotão não passa de uma “sem-vergonha”? O que se pode comentar sobre a prática dos estupros corretivos regidos pela idéia de que uma mulher se torna lésbica pela falta de um bom órgão fálico? E sobre os filmes pornográficos ou imagens de arte erótica onde o prazer está sob ótica masculina?
A
homossexualidade é uma dentre quatro categorias de orientação
sexual, mas parece que o lesbianismo está à parte num país
heteronormativo que interfere na postura pessoal, particular, não
facilita a organização para uma luta de ocupação de estado de
direito de ser e existir. E o que não é visto não existe
tornando-se indiferente por não haver "o que", "com quem", ou como
reclamar ou reivindicar.
Uma
lésbica não deixa de ser uma mulher (será que posso dizer que uma
lésbica é uma mulher sem ofender alguém? Tomara que sim!)
necessitando, assim se prevenir de DSTs, câncer de mama, câncer do
colo do útero e outras doenças que causam a morte. A
invisibilidade acarreta a falta de orientação e educação,
trazendo o prejuízo da auto-estima disfarçada de vocação para
Mulher Maravilha... Num momento em que as minorias se voltam para a
oportunidade de exercer e lutar por seus direitos, inclusive o de
formar famílias homoafetivas, cabe pensar que a lei atua onde falta
o respeito e esse inclui o cuidado e orientação para a saúde.
Quando
mulheres heterossexuais independentes sexualmente são vistas como
periguetes, as mulheres vaidosas são vistas como peruas e as
mulheres recatadas são chamadas de sonsas, a causa lésbica se
universaliza. Há um longo caminho a percorrer para que as lésbicas
sejam vistas como mulheres dignas de respeito e a articulação para
que venha esse respeito não pode ser delegado exclusivamente às
ativistas. Cuidar de si, ter o seu espaço e direito é uma luta
diária que cabe até mesmo dentro da timidez e da discrição...
“A
homossexualidade foi catalogada em cerca de 5 mil espécies animais,
foi bem estudada e devidamente comprovada em no mínimo 200 delas,
incluindo platelmintos” (considerados vermes). Sobre as mulheres
homossexuais praticamente não há estudo, pesquisas ou
estatísticas... Os vermes mereceram mais atenção e ocuparam mais
espaço do que as lésbicas, o que fazer?
Adorei o texto. Estou pesquisando sobre o assunto para um livro, onde eu quero que uma de minhas personagens tenha um relacionamento homoafetiva (não sei se é assim que se escreve) na verdade não entendo porque colocar nomes diferentes pra relacionamentos de pessoas do mesmo sexo, pra mim são pessoas como qualquer outra.
ResponderExcluirEnfim... Obrigada, seu texto me ajudou bastante, agora tenho um ponto de partida para a minha personagem.
Oi, Nairim!
ExcluirConcordo contigo, relacionamento é relacionamento e os nomes deveriam ser os mesmos.
Boa sorte com o seu livro e não esqueça de me convidar (ou informar sobre) para o lançamento! Quero ler.
Abraço.