28 de fev. de 2014

NO CAFOFO DA TIA SURICA | OUVINDO HISTÓRIA DE CARNAVAIS

Semana passada, estava tristinha e dei uma passadinha na casa da Tia Surica pra saber como ela estava, matar o tempo, a tristeza ou o tédio sEi lá. Não importa a praga que nos assole, ela fica exterminada! Digo isso porque estava num dia de ouvir. Lá encontrei Aurinha, Leonor e a cerveja gelada da Dona Elza. A conversa entrou pelo assunto dos segredos e supresas que as escolas preparam para exibir na avenida. Antigamente tinha mais mistérios envolvendo esses preparativos.

Áurea Maria, filha de Manacéa e Dona nenem. Pastora da Velha Guarda da Portela
Aurinha contou que ela era bem pequena e via ali na frente da Portelinha, alegorias enormes, imensas provavelmente por causa do seu tamanho de menina miúda. Todas cobertas e aí vinham os homens e começavam a empurrá-las de Oswaldo Cruz até a Presidente Vargas, onde aconteciam os desfiles das principais escolas.

Calada que eu estava, não contive uma cara de espanto e de boca aberta perguntei: - Como assim? Ao que ela respondeu:- "É! Iam empurrando daqui até lá. Com todo cuidado pra não quebrar, não estragar nada, porque naquele tempo não tinha toda essa tecnologia, essa facilidade pra consertar, as coisas. Tudo sem receber um tostão, por amor à escola".

Fiquei muito pensativa e que bom que era meu dia de ouvir. Aurinha segue falando:- E havia uma troca de informações, uma escola ajudava à outra.  Lembra Leonor? O seu fulano?"(esqueci o nome do homem)Era o melhor eletricista da cidade. Nossa! Muito fera, sabia tudo de como colocar iluminação nas alegorias. Era do Império e aí o seu sicrano (esqueci o nome do outro homem) falava com ele e, ele explicava tudo porque ele era do Imperio não ia fazer as coisas aqui na Portela, mas ensinava  como fazer e aí a Portela fazia e ficava lindo!".

Teve um ano (e ela citou o ano) que a Portela fez uma alegoria que era assim um morro, aí o morro se abria e subia a cidade do Rio de Janeiro!! Olha mas aquilo foi um espetáculo e era uma surpresa, ninguém sabia.

Dois goles depois chega Tia Surica:
Lembra Surica aquele ano que a Portela trouxe um morro que abria e acidade subia assim toda iluminada?- "Lembro! Aí eu cataploft! Caí. Porque era uma surpresa tão surpresa que ninguém sabia. Quando eu olhei pra trás que eu vi aquilo subindo, tomei um susto tão grande que caí no carro" . E graciosamente faz o gesto como se caísse da cadeira. E emendaram a cantar o samba-enredo desse ano.

E eu ali... Ligeiramente melancólica por tudo o que perdi por não viver, mas intensamente satisfeita por ter pelo menos como saber que houve um dia um carnaval simples, carregado a muque do subúrbio ao Centro, coberto de cuidados e amor sem preocupação com dinheiro.

Houve um dia um Império agregador unido à uma Portela capaz de surpreender o mais íntimo dos  seus competentes.

Talvez a vida não seja muito justa tirando de tantos o direito de ver essa beleza. Talvez não sejamos justos exigindo ver belezas que não tem raízes, consistências ou profundidade. A beleza por si só, comprada nas lojas, impregnada de tecnologia que não carrega em si o fundamento de almas belas.Fiquei  imaginando e lembrei do ano passado quando o carro do Salgueiro quebrou ali na curva de entrada, abrindo um claro mais adiante, talvez perdendo ali naquele fato o título que fazia por merecer. A correria dos homens, empurrando, aquele gigante que agora se transformava num elefante branco. Os muques retesados, semblantes desesperados empurrando a alegoria de um ponto a outro da avenida. Um rasgo de quando o dinheiro passa a não ser diferencial o importante é a escola seguir adiante e fazer bonito. Ai, as dificuldades que de resgatam o que melhor o samba tem....

Se eu fosse compositora, me mudaria ontem pra Madureira. Invadiria a casa do Monarco, não deixaria de visitar casquinha, ia ser parceira do Ivan Milanez e quem mais me "desse confiança" mas nenhuma derrota me faria deixar de competir, porque as fontes estão aí, há que ter coragem de beber dessa água que jamais nos deixará em paz, vestirá nossas almas de tecido antigo e quem sabe descobriríamos a fórmula de juntar o tudo de bom ainda que sob as luzes de tanta modernidade, correria e tecnologia.

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