Não sei se vocês sabem, mas há tempos fui uma feliz dona de bar. Bar este que um dia foi uma birosca. Antes era venda de cerveja na porta e acabou virando um restaurante que além de servir comida (rápida e demorada), servia para transmitir jogos de futebol em telões, no tempo que tela grande era coisa de cinema.
Também servia como um cineclube onde as pessoas deixavam na caixinha de sugestões o filme que queriam ver na semana seguinte. Aos sábados tinha um pagode com um grupo que podíamos chamar de Os Amigos da Vizinha e por fim, escondidinhas na garagem ficavam umas mesas cobertas com paninhos verdes e uma mesa de sinuca.
Foi nesse cenário de muro baixo com grade, guardando uma casa verde esquina, que eu finalmente lá por volta dos meus vinte e tantos anos, comecei a conhecer a humanidade (a desumanidade, também), ali eu tive os contatos mais consistentes com as pessoas. Ou seja, larguei da vida de menina que queria ir (e foi) para o convento, de garota protegida, filha caçula criada com todo puritanismo em nivel hard suburbano, para conhecer as pessoas do mundo, frequentadoras de bar. Logo eu, abstêmia e não fumante, hábitos que adquiri depois dos 30.
Em comum com os meus frequentadores eu tinha apenas o profundo gosto por uma prosa à toa. O balcão era quase um confessionário, Eu era ainda bem lindinha e tinha lá uns fregueses para os quais a cerveja era penas o pretexto de cantadas insistentes que eu deixa rolar, pra não perder o cliente nem o amigo. Deixava os coitados na ilusão da possibilidade remota e o pé de comigo-ninguém-pode completamente alcoolizado, pois não adiantava eu dizer pros camaradas que eu não bebia, sempre o segundo copo era cheio, esse copo era para mim e como eu não bebia, a plantinha me fazia essa gentileza. E que ninguém do Ibama leia isso, porque a planta continua saudável e verde e abandonou o álcool, diferentemente de mim. O que a gente não faz pra sobreviver!
O meu bar era um celeiro de filósofos, afinal, estamos no Rio de Janeiro, né? Dois inesquecíveis: Paulinho "Mecânico" cuja citação preferida por mim era: "Assim como são as pessoas, são as criaturas".
E o "Barriga", ex-bandido evadido da Mangueira, que de lá trazia como lembrança 2 relevos na canela e panturrilha que abrigavam duas balas calibre 32. Barriga chamava todo mundo de "Vizinho", falava com a língua meio presa, tinha um cabelo inacreditavelmente esticadinho, era esquisitinho pra caramba e dentre sues vários bordões, o meu preferido era:
"Se da, dá. Se não dá, não dá, mas bota uma Da Roça no meu copo, porque seco é muito difícil, vizinha!"
E o "Barriga", ex-bandido evadido da Mangueira, que de lá trazia como lembrança 2 relevos na canela e panturrilha que abrigavam duas balas calibre 32. Barriga chamava todo mundo de "Vizinho", falava com a língua meio presa, tinha um cabelo inacreditavelmente esticadinho, era esquisitinho pra caramba e dentre sues vários bordões, o meu preferido era:
"Se da, dá. Se não dá, não dá, mas bota uma Da Roça no meu copo, porque seco é muito difícil, vizinha!"
Pois, é. Confesso que vivi.
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