21 de mai. de 2016

Vamos falar de Amor - 3

Amor é só um sentimento que às vezes até dói, outras faz doer. Às vezes a gente ama tanto uma criança, um filho que tem vontade apertar e, aperta mesmo sabendo que pode doer. 

Acho que já vem no manual que os filhos são nossos porque nesse manual vem a indicação que é nosso aquilo que cuidamos, aquilo que nos custa e tem custo, aquilo que demanda trabalho. Aquela coisinha linda sem que percebamos é uma coisa, uma coisa que é nossa e "sabemos" muito bem o que fazer com o que é "nosso". Ponto.

Aí, a gente cresce e vira uma pessoa, vai botar na cabeça dos pais que não somos pertences deles, se existe uma certidão de nascimento que comprova isso. Comemos da sua comida, tomamos horas do seu sono, impedimos alguns de seus prazeres ainda que a princípio existamos para lhes dar algum prazer. Não vem ao caso o fato de não termos enviado um requerimento para nascer. Somos, nesse caso, escolha alheia o que, de certa forma, impede algumas ou muitas das nossas escolhas.

Filhos, bichos, bichinhos, plantas e objetos, tudo é nosso. É difícil entender porque a pessoa que amamos não seria nossa também, principalmente pertencendo à uma civilização que certificou a posse como plena e válida.

Eram dos homens as mulheres, eram dos senhores os escravos, como eram dos fazendeiros o seu gado, como são do agricultor suas plantações.
Mulheres eram objetos em dobro, além de filhas pertenciam às famílias que ignoravam os sentimentos que elas pudessem ter. A postura feminina era da sociedade. Tudo da mulher sempre disse respeito a todos.

Era das famílias o direito de decidir com quem se casariam ou não, para que serviriam. Elas aprendiam prendas domésticas e trabalhos manuais - atributos artificiais agregados aos seus dons naturais de modo que o dote pudesse valer mais. Cabia à família do noivo pagar um dote à família da noiva para que se casassem e aquilo por que pagamos é de quem pagou, certo?
Por terem assim seus destinos tão pré-definidos não cabia-lhes aprender a ler e escrever, votar, escolher. Uma forma de exercer a lei do mais forte com muita civilidade. As leis se baseavam nos costumes, logo, qualquer pensamento diferente, obviamente infringiria a lei.
As ricas evitavam o sol para manter a pele clarinha de modo a diferenciá-las das camponesas e escravas, de modo a exibir uma aparência o mais próximo possível da nobreza. Valorizava a mulher ter aparência européia ainda que sobrevivêssemos num sol escaldante. Aos pobres restavam a preferência pela força e competência para ter tantos filhos quanto possível, gerando mais braços para trabalhar para o sustento da família - cada um investe com o que tem para tentar ganhar.

O tempo passou evoluímos o suficiente para descobrirmos que negros são gente, pessoas possuidoras de almas e mulheres não são artigos de um comércio velado e hipócrita. Alguns de nós descobrimos que há uma diferença entre os verbos descobrir, perceber e saber, aceitar, praticar.

O tempo das cavernas nos humilhou com a realidade de que não éramos os mais fortes das selvas e ambientes hostis e para que parecêssemos fortes diante dos semelhantes criamos o poder e para que o poder mudasse de mãos ou não, criamos as leis. Leis que impedissem a lei do mais forte mesmo que tivessem como espinha dorsal a mesma lei do mais forte, afinal somos civilizados.

Nos esforçamos para ser civilizados e o quanto para sermos amorosos? A lei é punitiva mesmo quando pressupõe ser educativa. Nunca soubemos lidar com a violência e sabemos menos ainda lidar com o nosso amor. Na nossa condição de animais, o raciocínio se sobrepôs ao instinto e ao afeto de um jeito que quando escrevemos a palavra de Deus fizemos d'Ele a imagem e semelhança da nossa violência com preceitos em forma de preconceitos, castigos e julgamentos. E ao Deus que falou de Amor, presenteamos com um insano julgamento legal, mais violência e uma cruz. Nem Deus foi mais forte que a força das nossas leis.

Não sabemos onde pôr nosso amor, porque esse amor nos faz iguais e precisamos de leis para marcarmos todas as nossas (in)diferenças. O amor talvez seja demais libertador para uma raça que precisou lidar desde sempre com a força e a superioridade que se por um lado garante a sobrevivência, são raízes da violência e por mais que digamos que não, não gostamos de mudanças, principalmente mudanças que dividem, repartem aquilo que é inteiramente nosso ou queremos que seja.

O mais forte é o que detem algum poder, venha esse poder das armas como a clava, a lança e o fogo ou a arma e o dinheiro e porque não, o conhecimento não somente das leis mas das suas fragilidades e equívocos.

Poder é sempre poder. Lei será sempre lei. Mudam-se os adjetivos da "força" mas o mais forte poderá sempre mais.

#escrevendoprapensar

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