11 de set. de 2020

Mentes Brilhantes Que Se surpreendem

Estou fazendo aulas de escrita criativa porque a gente nunca sabe o suficiente e jamais serei criativa o suficiente.

Foram apresentados 3 textos de mulheres dentre eles, texto de Carolina Maria de Jesus. A professora leu e eu fui assim me sentindo  a pessoa mais antipática do planeta porque caí de amores por um texto de uma autora que eu desconhecia 100% enquanto as colegas se rendiam com olhos lacrimejantes à Carolina e Conceição Evaristo e com o peito apertado se entregavam à admiração por Carolina. 


Sim, Conceição é entidade, hors concours toda vez que eu leio Olhos D´água me deparo com  olhos desérticos de minha mãe e de todas as mulheres da minha vida que não traziam água, eram de cobre, de ferro e de fogo. E todo o afeto não recebido, me prova um amor de quem tirou de si uma ternura que nunca lhe brotou, crendo muito mais no tempo que passa e transforma que no amor que nem sabemos se virá.

Aquela mãe lúdica que disfarçava a fome com carinho eu não tive, mas tive uma mãe que nem era minha direito, que acordava às 3 da manhã quando poderia descansar, que viveu sozinha, quando poderia namorar,  receosa de ter em casa um homem amado, porém estranho já que restava da prole, uma menina caçula que pra brincar só tinha o cão da casa e comia comida requentada todos os dias ou um ovo frito feito pelo vizinha.

Lembro do Joãosinho 30 que dizia que intelectual/rico é que  adora uma miséria. As pessoas se surpreendem com Carolina Maria e até hoje não entendo porque.
Por que ela sabia ler e escrever?
Por que ela era uma preta e tinha talento?
Por que ela tinha coragem de escrever a rotina de uma catadora?
Por que ela conseguia tempo para se dedicar à escrita?

Quantos pobres no mundo serão capazes de resenhar suas desgraças e descrever as cores da sua fome e retratar a escuridão de seus medos, o risco de tudo aquilo a que sempre estão expostos, tétano,  berne, espinhela caída, chute na bunda, expulsão da calçada, dor de dente, hipotermia, hipetermia, ressaca, pileque, cachaça, fogo, tiro, polícia, cadeia, tuberculose, piolho, pereba, abandono.

Esse susto ou embasbacamento que vejo as pessoas terem cada vez que trombam com um pobre, com um preto que faz bem alguma coisa e me deixa desconfortável por uma total falta de entendimento do que se passa nessas mentes tão brilhantes ainda assim, surpresas.

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