14 de nov. de 2008

ELEIÇÕES

Nunca transferi meu título de eleitor, gosto de rituais. E se vocês estão pensando que vou falar sobre eleições ou espiritualidade, erraram feio! Gosto daqueles rituais que enfeitam a vida e podem tirar nossos olhos da rotina. Votar é uma coisa prática e ir ao bairro da minha infância não é. Dá preguiça de ir e quando chego tenho preguiça de voltar. É longe. Portanto, me obrigo a ir lá com a obrigatoriedade do voto. Alguma coisa boa precisa vir dessa lei absurda! Assim, encontro os amigos. É divertido, é estranho, é sempre uma surpresa.

Eu acho o máximo aquelas pessoas no boteco “dando volta” na “lei seca eleitoral”, o churrasco na calçada colorido pelas bandeiras e panfletos espalhados pelas calçadas. Tudo coisa proibida, feita escancaradamente, mais gente na rua, muito movimento, coisas que lá só acontecem no carnaval.

Revejo muitos dos que fizeram parte de um tempo bom da minha vida e isso é curioso: Hoje vejo o meu passado e acho bom, mesmo as épocas que sei, não foram boas. Hoje, rio das surras, dos castigos e das broncas de infância, dos “coiós” da adolescência. Dos planos que deram errado e dos sonhos que nunca aconteceram... Deve ser porque tudo passou e sobrevivi.

Eu encontro pessoas, que não vejo há séculos e é no rosto delas que percebo a passagem do tempo. Nós mudamos sem nos dá conta, crescemos sem perceber e envelhecemos sem notar. É no corpo do outro que reparamos as rugas, os quilos a mais. É na nossa forma de acolher ou sermos acolhidos depois de uma grande ausência, que entendemos o quanto fomos queridos ou não.

Rever o colega de escola e sentir que ele não mudou nada, ele chegando como se nada tivesse acontecido na vida dele ou nossa, relembra aventuras e desventuras infantis ou juvenis, receber um abraço ou aperto de mão caloroso e aí, percebemos que não deveríamos ter ficado ausentes tanto tempo!

Rever aquele nosso antigo melhor amigo... Ele nos cumprimenta polidamente, nos olha de cima abaixo, se mantém distante e a gente não entende o que tinha em comum com aquela pessoa... Ele diz: “Você não mudou nada!” ou ele diz: “Como você está diferente!” E a gente sorri amarelo, sem saber se é um elogio ou uma crítica, na dúvida, dizemos um “você também”.

É inevitável as comparações entre uns e outros, entre nós e eles. Alguns levam uma vida que damos graças a Deus por não sermos nós que a estamos vivendo. Outros, nos dão uma inveja, independentemente de sermos invejosos ou não!

Certas coisas não têm explicação, o aluno mais brilhante e inteligente está desempregado e acabado. Aquele que era a chacota do bairro se deu bem, tem um carrão, mulherão, casarão.

Numa visita só não consigo saber com certeza quem é feliz, também não consigo adivinhar quem vai falar mal de mim assim que eu virar as costas. Certas coisas na vida apenas podemos deduzir e embora não seja importante certificar, fica no ar a curiosidade, a vontade de ter certeza... Como sou figura rara, sinto o peso da curiosidade deles me encarando, a insistência de alguns olhares que não decifro se brilham me dizendo “coitada” ou “bem feito!”.

Perguntam pelo filho que não tive, pelo casamento que não aconteceu. Perguntam por quem me acompanhava da última vez que souberam de mim. Perguntam e falam e troca olhares entre si como quem diz, “viu?”

Não adianta convidar, eles não irão atravessar a cidade pra me visitar, mas convido assim mesmo. Num canto do meu coração eu sei que essas pessoas são como páginas de um livro, que guardo com carinho ou apenas cuidado, um livro que até posso reler, mas dificilmente reeditar.

Penso: a cada momento estamos escrevendo através dos nossos relacionamentos o livro da nossa vida, cuidemos então, para que seja uma história boa de se reler, boa de se escrever, sobretudo, saudável de se viver e se necessário um dia for possa ser reeditada

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