Nasci e me criei em Jacarepaguá. Por um bom tempo não me adaptei
viver em outro bairro, foi mais fácil acostumar-me com outro país. Eu gostava
das longas e intensas sombras ao longo das ruas que nos protegiam. Eu amava
acordar ouvindo sons incríveis, sentindo cheiros inacreditáveis. Era bom
reconhecer os rostos de quem eu encontrava na rua.
Minha mãe trabalhava no Centro, o que o nativo de Jacarepaguá
chama de "cidade", como se ele vivesse em outra cidade, estado,
planeta - daí comecei a dizer que Jacarepaguá é capital da província de Nárnia.
Minha mãe trabalhava no Centro da cidade do Rio de Janeiro, mais precisamente
no Estácio, então, ela tomava o 241 (antes era o 267 que oferecia uma excursão
suburbana) e saltava na Cidade Nova, entrava ali ao lado de onde depois,
construíram o Piranhão, antes era só a zona, mesmo.
O ônibus 241 um dia foi uma novidade que ligava, através dessa
auto-estrada, Jacarepaguá ao restante do Rio. Ela começa na Freguesia que é um
sub-bairro de Jacarepaguá e termina no Grajaú/Vila Isabel, ali pertinho do
"Clube da Light".
Ir com a minha mãe ao trabalho foi o primeiro contato consciente
que tive com favelas. Porque no alto da auto-estrada vislumbrava-se aquelas
moradias que chamavam de barracos. Que eu lembre, de favela no bairro tínhamos
à época, Rio das Pedras que logo se mudou para Barra, Gardênia Azul possuía até
umas palafitas de madeira, mas como um tio meu morava lá, eu não entendia que
era favela, pois que ninguém nomeava assim, eram terras do Linifício Leslie
cedidas aos seus funcionários. No Jardim Clarice acontecia o mesmo com os
imensos quintais usados pelas famílias dos trabalhadores na fábrica da
Antárctica (cervejaria), mas isso eu já conheci depois de crescidinha. Tinha a
cidade de Deus também, inclusive, minha explicadora de Matemática ficava lá e
como não conhecia barraco na CDD, na minha mente de criança o conceito da época
de favela não se formalizava.
Na Praça Seca já havia surgido algumas favelas como a Chacrinha
e Bateau Mouche mas elas não eram vistas por quem passava de ônibus pela
Cândido Benício que tinha um trecho chamado Mato Alto que ia até o Ipase e onde
hoje está a Vila Olímpica local e na parte onde o mato era alto, vem descendo o
morro e chegando à rua um apinhado de casinhas que antigamente se chamavam
barracos. Aquelas favelas antes não vistas chegam atualmente ao asfalto.
Ainda
assim, na quele tempo nem tão distante, ficávamos sabendo de como o "dono
do morro" tinha atirado em mãos e pés de "pivetes" que roubaram
relógios dos motoristas em carros parados no sinal, ou aplicado uma coça nos
que roubavam bolsa de mulher, botijões de gás nos quintais adjacentes e do
justiçamento aplicado naqueles que roubavam mais pesadamente nas imediações.
Então, subindo a Auto estrada Grajaú-Jacarepaguá, víamos um
aglomerado de casas, casinhas, casebres, barracos. A uma certa altura, os
moradores dessas favelas (era o nome da época que confesso acho muito mais
bonito que "comunidade") começaram a entrar pela porta da frente do
ônibus, posto que, havia um trocador que ficava na parte de trás do coletivo ao
qual devíamos pagar a passagem. Foram delimitados pontos ao longo dessa via
onde não se pagava a passagem e as pessoas entravam quase sempre aos grupos,
aglomeravam-se na ali na entrada, próximo ao motorista e iam descendo onde
tinham que descer. Sobre essa prática comentava-se na época que era um acordo
com os bandidos locais a fim de garantir que os ônibus que trafegavam por ali e
seus passageiros não fossem assaltados, uma coisa que acontecia muito nesses
anos 70/80 e na Grajaú-Jacarepaguá acontece até hoje.
E era assim em vários locais onde havia comunidades, os bandidos "zelavam" pela ordem nos acessos próximos aos seus "domínios", dizia o povo que a
fim de evitar investidas da polícia, de modo a não atrapalhar o seu comércio de
"entorpecentes" - que era assim que se chamavam as drogas
Então você está lendo esse texto e deve estar se
perguntado: "E o quico"? (E o quico = E o quicotenho com isso)
É que ainda não entendi, nem entrou na minha cabeça que bandidos, ladrões foram esses que assaltaram a quadra do Império Serrano, roubando funcionários que trabalham para o carnaval da escola... Escola de samba, fruto da vivência das pessoas em comunidade, Império Serrano, representatividade de uma comunidade com uma história linda, assaltada! Nem sei o que penso. Quando souber eu volto.
É que ainda não entendi, nem entrou na minha cabeça que bandidos, ladrões foram esses que assaltaram a quadra do Império Serrano, roubando funcionários que trabalham para o carnaval da escola... Escola de samba, fruto da vivência das pessoas em comunidade, Império Serrano, representatividade de uma comunidade com uma história linda, assaltada! Nem sei o que penso. Quando souber eu volto.
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