Meu amigo está de caso novo.
“Caso” porque talvez ainda não seja namoro. A cada dia nomear os
relacionamentos se torna mais complicado. As pessoas insistem que ter um nome
para que se pregue um rótulo.
Difícil visualizar a linha que separa o “namorar” e o “conhecer”; Entre o “xavecar” e o “ficar”. Esses limites
que são apenas uma palavra balaio de vários verbos quasempre todos com a mesma
intenção. O conhecer tem muito a ver com a ” intenção de matar” : por
mais óbvia, impossível acusar, sem chance de punição, condenando-nos por
ausência de provas.
O mundo, tem hoje necessidade de coisas múltiplas e o “ficar” é bom porque pode-se “ficar” com muitas pessoas numa
noite ou, com uma, sem a obrigação de manter-se com ela numa outra noite
qualquer. Se a “ficada” se prolonga, podemos dizer que estamos “conhecendo”, algo
mais íntimo e que não tem a cobrança dos namoros.
O mundo anda com uma necessidade de leveza e as pessoas necessitando de
uma certa irresponsabilidade consentida por mais que saibamos que a
cobrança virá no fim ou no meio, porque no início todo mundo concorda com
qualquer coisa que não lhe deixe só.
Namoros, noivados, casamentos tiram das nossas mãos o
controle sobre nossos relacionamentos. Existem posturas recomendadas para
casados, para noivos e noivas, para namorados. Depois que
oficializamos, com títulos reconhecidos os nossos relacionamentos, parece que o
mundo inteiro adquire direitos sobre eles.
Então que o meu amigo que está de caso novo e
comentou algo a respeito de apresentar o seu affair à
família, o que me gerou algumas reflexões, afinal ele passou anos
com um namorado que levou algum (talvez muito) tempo até que soprasse
sobre a família os ventos da tolerância, essa palavra que pode ser tão desagradáveis quando
pensada: Tolerância, onde tolerar = aturar, suportar. Suportar
porque não resta outra alternativa.
Uma coisa era tolerar o namorado, outra coisa era aceitá-lo ou gostar dele, eis
aí um complicador. Além de se aceitar um familiar homossexual, precisa
aceitar-se que ele tenha um namorado e precisa-se aceitar a pessoa desse
namorado.
Enfim, aceito, amado ou tolerado, esse namorado
ficou na vida do meu amigo e da família deste por mais de 10 anos. O que gerou
uma incômoda comodidade, afinal, após tanto tempo todo mundo se
acostuma com tudo e não há mais comentários.
Meu amigo terminou o relacionamento antigo, engatou
uma primeira, acelerou e já está de bofe novo. A família anda tonta com as
lamentações e telefonemas do agora “ex” e logicamente não quer
saber de conhecer ninguém novo, afinal não quer mudar de problemas.
O pobre ex não se “manca” que toda paciência
familiar chega ao final quando o romance, normalmente por falta de paciência,
ao final chega.
Talvez ele avalie que depois de tantos anos possa contar com uma família
também.
Talvez ele pense que realmente foi amado por todos esse tempo todo. Pagando de
bicha burra e também presunçosa, não percebe que para as famílias
ser gay é uma doença e o parceiro apenas sintomas da sua gravidade, o
gatilho que dispara o caminho da agonia.
Fico a me perguntar por que diabos meu amigo tem que
apresentar a novidade para a família. Em determinados clãs ser gay é como ser casado, onde o casamento é consumado
com a família e o namorado ocupa o lugar que seria de uma amante.
As pessoas desconfiam, mas como uma esposa dedicada, não querem se certificar,
pois isso incluiria tomar um posicionamento.
Qual mulher com anos de casamento estaria disposta a largar o casamento porque
o marido arranjou outra?
Uma mulher que percebesse nisso a oportunidade de ter uma vida nova, oras!
Uma mulher que não estivesse satisfeita com a vida e o marido atuais, talvez.
No caso da família do meu amigo, todos estão
satisfeitos com a vida tranquila e falta de paixão que assolava o casamento
dele e que fazia com que ficassem por ali divertindo-se (ou aborrecendo-se) com
a família. Não havia a paixão avassaladora e desejo de privacidade que os
levassem a querer ira para Tegucigalpa ou qualquer lugar onde ele pudessem dar
vazão à libido. Pra falar a verdade ultimamente, cada ficava na sua casa nos
fins de domingo, numa tentativa de não multiplicar o tédio por 2…
Família é troço muito esquisito mesmo!
Qualquer mau humor, recalque ou infelicidade num presumido celibato é melhor do
que alguma felicidade.
Sabemos todos nós que dificilmente o ser humano estará sorridente, completo e
feliz sem romance e nenhum romance torna alguém sorridente, completo e feliz
sem sexo.
Se alguém deseja a fama de bom moço, basta que não deixe perceptível o seu
desejo. Todo gay é ótimo se leva uma vidinha famíliar, cuidando dos sobrinhos ou se
preocupando com os poodles da vovó.
Todo mundo que casou várias vezes recebe ainda que veladamente o julgamento de
ser promíscuo, mesmo que tenha sido um casamento de cada vez. Mas isso é outra
história.
Voltando ao casamento do meu amigo, é fato
que depois de arrancar-se da família a tolerância para com a
condição homossexual, a aceitação de cada parceiro era uma luta nova.
Hoje, imagino que ao final de cada de relacionamento o
que as famílias mais desejam seja o milagre do disco virado, ignorando-se o
lançamento do CD.
Cada pessoa que vem a seguir é como o tal já mencionado
sintoma de uma doença, daqueles que a gente fica feliz quanto menos
incomodativo seja. Imagino que o julgamento deve ter valores semelhantes
aos de uma avaliação bastante lógica e compreensível: “É melhor ter uma
gripe do que câncer. Antes perder um dente que uma perna”. “Esse não é grande
coisa mas não usa droga”. “Aquele não era simpático mas era discreto”.
Logo, para o meu amigo conseguir apresentar com
sucesso um novo parceiro à família aconselharia que se mostrasse imensamente
infeliz, extremamente impaciente, fazer algo que eles não gostam para que
o novo “amigo” seja visto como alguém que veio somar à harmonia familiar.
Claro que ouvi em silêncio e em silêncio permaneci.
Vida dura essa!
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