3 de abr. de 2011

O NOVO CASO DO MEU AMIGO

Meu amigo está de caso novo.
“Caso” porque talvez ainda não seja namoro. A cada dia nomear os relacionamentos se torna mais complicado. As pessoas insistem que ter um nome para que se pregue um rótulo.


Difícil visualizar  a linha que separa  o “namorar” e  o “conhecer”;  Entre o “xavecar” e o “ficar”. Esses limites que são apenas uma palavra balaio de vários verbos quasempre todos com a mesma intenção. O conhecer tem muito a ver com  a ” intenção de matar” : por mais óbvia, impossível acusar, sem chance de punição, condenando-nos por ausência de provas.


O mundo, tem hoje necessidade de coisas múltiplas e o “ficar” é bom  porque pode-se “ficar” com muitas pessoas numa noite ou, com uma, sem a obrigação de manter-se  com ela numa outra noite qualquer. Se a “ficada” se prolonga,  podemos dizer que estamos “conhecendo”, algo mais íntimo e que não tem a cobrança dos namoros.
O mundo anda com uma necessidade de leveza e as pessoas necessitando  de uma certa  irresponsabilidade consentida por mais que saibamos que a cobrança virá no fim ou no meio, porque no início todo mundo concorda com qualquer coisa que não lhe deixe só.

Namoros, noivados, casamentos tiram das nossas mãos o controle sobre nossos relacionamentos. Existem posturas recomendadas para casados, para noivos e noivas, para namorados.  Depois  que oficializamos, com títulos reconhecidos os nossos relacionamentos, parece que o mundo inteiro adquire direitos sobre eles.
Então que o meu amigo que está de caso novo e  comentou algo  a respeito de apresentar o seu affair  à família, o que me gerou algumas  reflexões, afinal  ele passou anos com um namorado que levou algum (talvez muito)  tempo até que soprasse sobre a família os ventos da tolerância, essa  palavra que pode ser tão desagradáveis quando pensada: Tolerância, onde tolerar =  aturar, suportar.  Suportar porque não resta outra alternativa.

Uma coisa era tolerar o namorado, outra coisa era aceitá-lo ou gostar dele, eis aí um  complicador. Além de se aceitar um familiar homossexual, precisa aceitar-se que ele tenha um namorado e precisa-se aceitar a  pessoa desse namorado.

Enfim, aceito, amado ou tolerado,  esse namorado ficou na vida do meu amigo e da família deste por mais de 10 anos. O que gerou uma incômoda comodidade, afinal,  após tanto tempo  todo mundo se acostuma com tudo e não há mais comentários.

Meu amigo terminou o relacionamento antigo, engatou uma primeira, acelerou e já está de bofe novo. A família anda tonta com as lamentações  e telefonemas  do agora “ex” e logicamente não quer saber de conhecer ninguém novo,  afinal não quer mudar de problemas.
O pobre ex  não se “manca” que toda paciência familiar chega ao final quando o romance, normalmente por falta de paciência, ao final chega.
Talvez ele avalie que depois de tantos anos possa contar com uma família também.

Talvez ele pense que realmente foi amado por todos esse tempo todo. Pagando de bicha burra e também presunçosa,  não percebe que para as famílias  ser gay é uma doença e o parceiro apenas sintomas da sua gravidade, o gatilho que dispara o caminho da agonia.

Fico a me perguntar por que diabos meu amigo tem que apresentar a novidade para a família. Em determinados clãs ser gay é como ser casado, onde o casamento é consumado com a família e  o namorado ocupa o lugar que seria de uma amante.
As pessoas desconfiam, mas como uma esposa dedicada, não querem se certificar, pois  isso incluiria tomar um posicionamento.
Qual mulher com anos de casamento estaria disposta a largar o casamento porque o marido arranjou outra?
Uma mulher que percebesse nisso a oportunidade de ter uma vida nova, oras!
Uma mulher que não estivesse satisfeita com a vida e o marido atuais, talvez.

No caso da família do meu amigo,  todos estão satisfeitos com a vida tranquila e falta de paixão que assolava o casamento dele e que fazia com que ficassem por ali divertindo-se (ou aborrecendo-se) com a família. Não havia a paixão avassaladora e desejo de privacidade  que os levassem a querer ira para Tegucigalpa ou qualquer lugar onde ele pudessem dar vazão à libido. Pra falar a verdade ultimamente, cada ficava na sua casa nos fins de domingo, numa tentativa de não multiplicar o tédio por 2… 

Família é troço muito esquisito mesmo!
Qualquer mau humor, recalque ou infelicidade num presumido celibato é melhor do que alguma felicidade.
Sabemos todos nós que dificilmente o ser humano estará sorridente, completo e feliz sem romance e nenhum romance torna alguém sorridente, completo e feliz sem sexo.
Se alguém deseja a fama de bom moço, basta que não deixe perceptível o seu desejo. Todo gay é ótimo se leva uma vidinha famíliar, cuidando dos sobrinhos ou se preocupando com os poodles da vovó.
Todo mundo que casou várias vezes recebe ainda que veladamente o julgamento de ser promíscuo, mesmo que tenha sido um casamento de cada vez. Mas isso é outra história.


Voltando ao casamento do meu amigo,  é fato  que depois de arrancar-se da família a tolerância para com a condição homossexual, a aceitação de cada parceiro  era uma luta nova.
Hoje, imagino que ao final de cada de relacionamento o que as famílias mais desejam seja o milagre do disco virado, ignorando-se o lançamento do CD.
Cada pessoa que vem a seguir é  como  o tal  já mencionado  sintoma de uma doença, daqueles que a gente fica feliz quanto menos incomodativo seja. Imagino que o  julgamento deve ter valores semelhantes aos de uma avaliação bastante lógica e compreensível:  “É melhor ter uma gripe do que câncer. Antes perder um dente que uma perna”. “Esse não é grande coisa mas não usa droga”. “Aquele não era  simpático mas era discreto”.

Logo,  para o meu amigo conseguir apresentar com sucesso um novo parceiro à família aconselharia que se mostrasse imensamente infeliz,  extremamente impaciente, fazer algo que eles não gostam para que o novo “amigo” seja visto como alguém que veio somar à harmonia familiar.
Claro que ouvi em silêncio e em silêncio permaneci. Vida dura essa!

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