À Josefina Maria de Jesus Lopes – in memória
É por ela, mulher negra analfabeta, desejosa de saber traduzir as letras que contam ficções em livros, verdades em jornais, e preces em bíblias, essa gratidão em palavras.
Mamãe teve avô professor, mas a alfabetização a ela foi negada, pela sentença machista da época:
— Neta mulher, não estuda.
Ela, uma mulher que insistia em abrir páginas dos livros e arranhar leituras como quem está a decifrar códigos secretos para alcançar tesouro ao final da leitura.
Achava engraçado quando na igreja ela ao negar o folheto da missa se desculpava:
— Obrigada, não trouxe meus óculos.
Mamãe fez MOBRAL, aos cinquenta, e quão grande foi sua alegria ao tirar o polegar de seus documentos.
Essa mulher que tateou livros com olhos, nos enriqueceu de livros, ela fez de nós, seus três filhos, leitores. E antes do letramento, liamos até Machado de Assis, claro que com o livro de cabeça para baixo. E criativas, escrevíamos, também, nossos livros e construímos castelos, muralhas ao historiar nossos sonhos.
Lembro-me de suas mãos sobre as minhas, tateando as primeiras letras, como quem busca sua própria alfabetização, quando nos auxiliava a cumprir o dever de casa.
Hoje escrevo. Escrevo com ela, por ela e para ela. Minha poesia primeira.
Texto de Benedita Lopes
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